São Paulo: uma megalópole em busca da multimodalidade
Descrição
geral
A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é formada por 39 municípios e foi criada pela Lei Complementar 1.139 de 16 de junho de 1973. O produto interno bruto (PIB) da RMSP corresponde à 18% do PIB brasileiro. A metrópole concentra importantes zonas industriais, como a região do ABC, a cidade de Guarulhos e Osasco, além da própria capital São Paulo.
A cidade de São Paulo está em constante transformação desde sua fundação em 1554. Nos tempos de colônia, São Paulo era uma cidade do interior e isolada do litoral, devido à Serra do Mar. No período imperial, entre 1822 e 1889, uma estrada de ferro passa a ligar São Paulo à costa. Outras ferrovias também foram construídas em direção ao interior, saindo de São Paulo. Uma importante onda de imigração ocorreu, principalmente de italianos que foram trabalhar nos campos de café. Na metade do século XIX, algumas indústrias começaram a se desenvolver. No começo do período da República, a onda imigratória continua com a chegada dos japoneses. Nessa época, São Paulo já era vista como uma metrópole próspera, que atraía muitas pessoas de outras regiões do país que buscavam melhores condições de vida na cidade grande.
A legislação para o planejamento do desenvolvimento urbano e dos transportes
Atualmente, existem três textos regulamentares que abordam o planejamento do desenvolvimento urbano e dos transportes urbanos.
O planejamento do desenvolvimento urbano é regulamentado, a nível nacional, pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 10 de julho de 2001), que estabelece, entre outras, a obrigação das cidades de mais de 20 000 habitantes de apresentar, num prazo de 5 anos, um plano diretor urbano do município.
A Lei 12.587 de 3 de janeiro de 2012 estabelece as diretivas da Política Nacional de Mobilidade Urbana. De acordo com esta lei, as cidades de mais de 20 000 habitantes deviam criar um Plano de Mobilidade Urbana (PMU) num prazo de 3 anos, ou seja, até 2015.
Em 2013, a Proposta de Emenda à Constituição nº 74, de 2013 (PEC 74/2013), vem modificar a Constituição Federal de 1988, incluindo o transporte como direito social, dando-lhe a mesma importância de outros itens já previstos pela Constituição, como a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados.
Com a declaração do Estatuto da Metrópole (Lei 13.089 de 12 de janeiro de 2015) as aglomerações urbanas[1] e as regiões metropolitanas[2] devem apresentar um Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) num prazo de 3 anos.
Quanto às cidades da RMSP, os planos diretores de somente 2, das 39 cidades, não foram encontrados. A situação quanto aos PMUs é mais preocupante:
- Somente 8 PMUs foram encontrados;
- 17 cidades começaram os procedimentos para a elaboração de um PMU (as 7 cidades que compõem o Consórcio Grande ABC se juntaram para a elaboração de um plano regional de mobilidade urbana);
- 14 cidades para as quais nada foi encontrado sobre os respectivos PMUs.
Quanto ao PDUI, a RMSP prevê que ele estará pronto no fim de 2017 e será dividido em três eixos:
- Coesão territorial e urbanização inclusiva;
- Conectividade territorial e competitividade economia, e;
- Governança metropolitana
Assim sendo, a temática dos transportes será objeto de análises cruzadas dos dados de oferta e demanda das cidades da RMSP para compreender melhor a interação entre as mesmas. Uma seção sobre o transporte de mercadorias também é prevista.
Os estudos são conduzidos pela Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A. (EMPLASA) et pelo Comitê de Desenvolvimento da RMSP (CDRMSP), sendo os dois organismos públicos.
[1] “Unidade territorial urbana constituída pelo agrupamento de 2 (dois) ou mais Municípios limítrofes, caracterizada por complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e socioeconômicas”
[2] “Espaço urbano com continuidade territorial que, em razão de sua população e relevância política e socioeconômica, tem influência nacional ou sobre uma região que configure, no mínimo, a área de influência de uma capital regional, conforme os critérios adotados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE”
Os atores da mobilidade urbana em diversos níveis
Diversas instituições de diferentes níveis influenciam no planejamento da mobilidade urbana. Na esfera nacional, os ministérios desempenham seus papeis no que tange a legislação e através de aportes financeiros. Pode-se destacar dois ministérios:
- Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil
- Ministério das Cidades (Política Nacional de Mobilidade Urbana, Estatuto da Cidade e Estatuto da Metrópole).
Na esfera regional, isto é, Estado de São Paulo, a EMPLASA e o CDRMSP são responsáveis pelo desenvolvimento urbano integrado e, consequentemente, tratará das questões de mobilidade urbana também.
A Secretaria dos Transportes Metropolitanos (STM) é a entidade responsável pela organização, pelo planejamento et pela gestão da rede de transporte metropolitano. Além da RMSP, a STM atua em outras regiões metropolitanas (de Campinas, de Sorocaba, da Baixada Santista, de Ribeirão Preto, do Vale do Paraíba e Litoral Norte) e na aglomeração urbana de Jundiaí. Quatro empresas públicas estão sob tutela da STM:
- METRÔ (Companhia do Metropolitano de São Paulo): empresa pública responsável por 4 linhas de metrô e 1 linha de monotrilho;
- CPTM (Companhia Paulista dos Trens Metropolitanos): empresa pública responsável por 6 linhas de trem metropolitano;
- EFCJ (Estrada de Ferro Campos do Jordão): empresa pública responsável pela ligação ferroviária entre Pindamonhangaba e Campos do Jordão e de algumas linhas turísticas;
- EMTU (Empresa Metropolitana dos Transportes Urbanos): empresa púbica que gere os contratos dos operadores privados dos ônibus intermunicipais metropolitanos e do operador privado do consórcio do VLT da RMBS. Na RMSP, a EMTU é somente uma gestora dos contratos de concessão e permissão dos operadores e das obras de infraestruturas (terminais e vias).
Além disso, a STM é responsável pela gestão dos contratos de parceria público-privado (PPP) de linhas de metrô. Atualmente, existem três contratos de PPP vigentes:
- ViaQuatro: operação e manutenção da Linha 4-Amarela por 30 anos (metrô subterrâneo);
- MoveSP: contrato do tipo BOT (build-operate-transfer) para a Linha 6-Laranja (metrô subterrâneo);
- VemABC: também do tipo BOT, para a Linha 18-Bronze (monotrilho).
Somado a esses três contratos, uma quarta concessão está prevista, para a Linha 5-Lilás e Linha 17-Ouro. O vencedor da concorrência pública irá operar e manter as duas linhas por 20 anos. A licitação foi lançada em abril de 2017. As empresas teriam até julho para submeter as propostas, porém este prazo foi adiado para setembro de 2017.
Existem estudos para a concessão da operação das linhas 8, 9 e 13 da CPTM, o que faria aumentar o número de atores envolvidos na organização do transporte urbano.
Na esfera municipal, as grandes cidades da RMSP contam com uma secretaria dedicada aos transportes. Em geral, duas empresas públicas são ligadas a estas secretarias:
- Uma para a organização do transporte coletivo na cidade, ou seja, os ônibus municipais;
- Uma para a gestão do tráfego e das vias. Na cidade de São Paulo, por exemplo, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) é a responsável pelo tráfego e pelas vias. É ela que planeja as ciclovias também. A São Paulo Transporte (SPTrans) é a empresa que controla o transporte municipal de ônibus.
Ademais, geralmente existe uma secretaria para o desenvolvimento urbano, ligada à prefeitura. Esta secretaria também tem papel importante na mobilidade urbana, já que ela estabelece as diretrizes de uso do solo do território municipal, influenciando assim o número de viagens gerados e atraídos por cada região.
A figura a seguir ilustra a organização dos atores dos transportes urbanos e do desenvolvimento urbano nos níveis nacional, regional e municipal.
O transporte coletivo sobre trilhos da RMSP
A rede atual de transportes públicos da RMSP é bastante complexa e envolve várias redes de ônibus municipais, uma rede de ônibus metropolitanos, uma rede de modos ferroviários urbanos (linhas de metrô e de monotrilho) e uma rede de trens metropolitanos.
A tabela a seguir apresenta a rede metro-ferroviária da RMSP em números.
A Companhia do Metropolitano de São Paulo (METRÔ) foi criada em 1968, sendo que a inauguração da primeira linha de metrô de São Paulo data de 1974. A Linha 1-Azul operava num trecho de 6,4 km, entre Jabaquara e Vila Mariana. Desde sua criação, a rede de metrô tem crescido numa taxa de, aproximadamente, 1,8 km por ano, totalizando 80,2 km em 2017.
Já a rede de trens metropolitanos da CPTM foi formada a partir das redes de duas companhias ferroviárias: a FEPASA (Ferrovia Paulista S/A) e a CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos). Os trechos urbanos destas ferrovias passaram a ser de responsabilidade da CPTM, em 1992. Alguns trechos da rede da CPTM tiveram sua inauguração nos anos 1860, por exemplo.
As redes de ônibus: transporte robusto e estruturante
O sistema de ônibus da RMSP é dividido entre os sistemas municipais (em cada uma das cidades) e pelo sistema de ônibus metropolitanos, gerido pela EMTU. Os sistemas são compostos por micro-ônibus, midibus, ônibus convencionais, articulados e biarticulados.
Cada cidade da RMSP é responsável pela organização e pela regulação de suas redes de ônibus. As cidades são também responsáveis pela infraestrutura viária. A Prefeitura de São Paulo, por exemplo, divide a sistema municipal de ônibus em subsistemas, em oito áreas. Cada área é objeto de uma concessão para prestação dos serviços de transporte público de ônibus de passageiros. Um subsistema pode ser operado por mais de um consórcio de operadores de ônibus. Se uma nova linha é criada, ela é atribuída ao operador da área.
Já a EMTU, responsável pelo sistema intermunicipal de ônibus na RMSP, divide os municípios em 5 áreas, sendo 4 para concessão[3] e 1, a do ABC, para permissão[4] dos serviços de transporte de passageiros a consórcios formados por múltiplos operadores de ônibus. Atualmente, 45 empresas dos consórcios ganhadores das cinco áreas, formam um único consórcio, o Consórcio Metropolitano de Transportes (CMT). O CMT é o administrador do Bilhete Ônibus Metropolitano (BOM), que permite a integração entre as linhas intermunicipais e também é aceito no METRÔ e na CPTM.
O sistema metropolitano da EMTU transportou, em 2016, cerca de 524 milhões de passageiros. Em novembro de 2016, a frota de ônibus regular da EMTU era de 4430 veículos, dos quais 3 375 acessíveis à deficientes físicos.[5] A idade média da frota regular, em 2016, era de aproximadamente 6 anos.
Além dos transportes sobre via férrea, o mapa do transporte metropolitano (Figura 4) também mostra os corredores de ônibus da EMTU. O Corredor ABD (São Mateus – Diadema) atende a zona sul de São Paulo e as cidades do ABCD (Santo André, São Bernardo, São Caetano e Diadema), totalizando 33 km de extensão de vias exclusivas providas de rede elétrica para trólebus. Outros 12 km, sem alimentação elétrica, ligam Diadema à Morumbi.
Na parte norte da RMSP, o Corredor São Paulo – Guarulhos terá 20 km de extensão, ligando a estação terminal Tucuruvi, da linha 1 do metrô, até Guarulhos. O primeiro trecho foi inaugurado em 2013 e um segundo trecho em 2015, somando 12,3 km até o momento. Neste eixo, as linhas da EMTU dividem a via com algumas linhas municipais de Guarulhos. Estima-se que, aproximadamente, 100 000 usuários/dia usaram este corredor na operação completa.
O mapa, por contemplar apenas as infraestruturas de transporte sob gestão do GESP, omite os corredores de ônibus da SPTrans. Alguns corredores são importantes eixos de transporte da região metropolitana e a inclusão dos mesmos no mapa poderia melhorar a experiência dos usuários, mostrando as alternativas de transporte existentes.
A SPTRANS transportou, em 2016, aproximadamente 2,9 bilhões de passageiros. Em julho de 2017, a frota da SPTRANS era composta por 14 463 ônibus (8 525 estruturais e 5 938 locais). Esses ônibus circulam por 1 350 linhas em operação na cidade de São Paulo e têm idade média de 5,5 anos.
No gráfico acima, pode-se notar o efeito do Bilhete Único (BU), que entrou em vigor em maio de 2004, somente para integração entre as linhas de ônibus. Com a instauração do BU, os usuários passam a poder utilizar até quatro ônibus, num período de duas horas, pagando somente uma tarifa. O efeito da aceitação do BU no METRÔ e na CPTM, em vigor desde dezembro de 2005, foi menor. Com o BU nos transportes por trilhos, os usuários deixam de pagar duas tarifas completas. Atualmente, paga-se R$ 3,00 no segundo modo de transporte na integração ônibus <-> trilhos. Desde 2009, a demanda se estabilizou em torno dos 2,9 bilhões de passageiros transportados por ano. Vale ressaltar que um passageiro que utiliza mais de uma vez o BU na mesma viagem, ou seja, utiliza dois ou mais ônibus num mesmo trajeto, é contado como dois ou mais passageiros transportados no sistema.
[3] Concessão: Lei 8.987/95, Art. 2º, II – concessão de serviço público: a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado; É formalizada por contrato administrativo (art. 4º, Lei 8.987/95)
[4] Lei 8.987/95, Art. 2º, IV – permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. É formalizada por contrato de adesão (art. 40, Lei 8.987/95). Prazo indeterminado mas pode ser revogado a qualquer tempo sem dever de indenizar.
[5] https://diariodotransporte.com.br/2017/02/21/onibus-do-sistema-emtu-de-tres-das-cinco-regioes-metropolitanas-de-sao-paulo-tem-idade-media-de-frota-acima-de-seis-anos/
Projetos futuros
Os projetos futuros da rede de transporte metropolitano são definidos numa publicação do GESP em 2013: “Atualização da rede metropolitana de alta e média capacidade de transporte da RMSP”. Trata-se de uma atualização do PITU 2025 (Plano Integrado de Transportes Urbanos 2025) para o horizonte de 2030, tendo como base a Pesquisa OD 2007 do METRÔ.
Este estudo estabelece o planejamento estratégico, as diretrizes e as linhas prioritárias para a expansão da rede metropolitana. Além dos técnicos da STM e das empresas públicas vinculadas a mesma, outros atores também participam da elaboração deste plano:
- São Paulo Transporte (SPTrans);
- Companhia de Engenharia de Tráfego (CET);
- Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU);
- EMPLASA;
- Secretaria de Logística e Transportes (SLT);
- Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU).
O Plano Plurianual (PPA) é uma lei estadual que estabelece o programa de metas para o médio prazo em termos econômicos, sociais, de desenvolvimento urbano e regional e de gestão pública. O PPA é elaborado durante o primeiro ano da gestão do governo e tem duração de 4 anos, ou seja, o PPA permanece válido no primeiro ano da gestão seguinte. O plano atual tem validade de 2016 a 2019, sendo que o mandato atual vai de 2015 a 2018.
No plano atual, estão comtempladas a modernização das frotas de metrô e de trem e dos sistemas de comunicação, a extensão de linhas existentes e a implantação de novas linhas. Quanto ao status das expansões ou implantações, pode-se destacar, notadamente:
- Linha 5-Lilás: 2,8 km e 3 estações inaugurados em setembro de 2017 e previsão de mais 7 estações até março de 2018. Acréscimo de 11,5 km de extensão da linha;
- Linha 13-Jade: linha que ligará o Aeroporto Internacional de Guarulhos à rede metropolitana de transportes na estação “Engenheiro Goulart” da linha 12 da CPTM. Previsão de conclusão em março de 2018;
- Linha 15-Prata: primeira linha de monotrilho, que hoje conta com duas estações e 2,3 km entre as estações Vila Prudente e Oratório. Previsão de inauguração de mais 8 estações e 10,1 km até março de 2018.
A Linha 6-Laranja foi concedida pelo GESP no formato BOT. O consórcio ganhador, Move São Paulo, iniciou as obras em janeiro de 2015, mas foram interrompidas em setembro de 2016, por dificuldades de o consórcio obter financiamento junto ao BNDES. O consórcio é formado pela Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC Engenharia, todas envolvidas na Operação Lava-Jato[6].
A Linha 18-Bronze, de monotrilho, foi concedida pelo GESP, também no formato BOT, ao consórcio VEM ABC em 2014 com previsão de início da operação em 2018. No entanto, devido à falta de recursos financeiros do GESP para as desapropriações necessárias e os aportes para as obras, as mesmas ainda não começaram.
Ademais, as linhas 5-Lilás e 17-Ouro foram oferecidas à iniciativa privada, em conjunto, numa única concessão. As propostas deverão ser abertas no fim de setembro, como já citado anteriormente.
[6] Maior operação de investigação contra a corrupção realizada na história da Polícia Federal. Desde 2014, quando a operação teve início, mais de 90 pessoas foram presas, entre elas políticos do alto escalão e presidentes de importantes empreiteiras. Estima-se que mais de R$ 40 bilhões (11 bilhões de euros) tenham sido desviados dos cofres públicos. Grandes obras de infraestrutura, inclusive de mobilidade urbana, foram paralisadas devido ao envolvimento das empreiteiras nas investigações.
Fala-se em “mobilidade urbana”
Desde as manifestações de junho de 2013, a mobilidade urbana é um tema que ganha cada vez mais espaço nas discussões do dia-a-dia. A urbanização rápida das grandes cidades não foi acompanhada por investimentos de infraestruturas de transporte necessárias, o que causaram constantes aumentos do tempo perdido no trânsito e a deterioração dos transportes públicos.
Estes problemas junto do aumento do preço da tarifa dos transportes coletivos desencadearam as manifestações populares de junho de 2013. Estes eventos chamaram a atenção das autoridades responsáveis pelo planejamento urbano nas principais cidades brasileiras.
Em São Paulo, a população saiu às ruas depois do anúncio, em junho de 2013, do aumento da tarifa de ônibus, que passou de R$ 3,00 a R$ 3,20 depois de um período de mais de dois anos sem reajuste tarifário (janeiro de 2011). As manifestações foram organizadas pelo “Movimento Passe Livre”, que defende o transporte gratuito.
Várias cidades acompanharam São Paulo e as manifestações se espalharam por todas as regiões brasileiras e no exterior. Os temas reivindicados evoluíram. Além do aumento da tarifa, falava-se também sobre a corrupção, sobre as propinas para construção dos estádios da Copa do Mundo, sobre os projetos de lei que privilegiavam os políticos acusados.
Antes destes eventos, quando se falava em transporte urbano, pensava-se basicamente nos ônibus, no metrô, no trem metropolitano, nas vias públicas e no trânsito. Ou seja, infraestruturas pesadas que transportam pessoas. Depois das manifestações, o termo “transporte urbano” evoluiu para “mobilidade urbana” e, agora, fala-se num sentido mais amplo, sobre acessibilidade, sobre os incentivos ao uso das bicicletas e da caminhada, da qualidade do serviço prestado.
Bicicletas e ônibus ganham prioridade sobre os carros
A gestão de Fernando Haddad (prefeito de São Paulo entre 2013 e 2016) foi marcada pelo crescimento do número de quilômetros de ciclovias na cidade de São Paulo e pela criação de corredores e de faixas exclusivas de ônibus. No começo de sua gestão, seu Plano de Metas, publicado em março de 2013, estabelecia diversos objetivos para a mobilidade urbana, notadamente:
A “proliferação” dos espaços destinados aos ônibus e às bicicletas foi alvo de duras críticas dos motoristas que utilizam o veículo particular nos deslocamentos do dia-a-dia. Nos principais eixos viários da cidade, os carros perderam espaço para os corredores de ônibus.
O nível de congestionamento da cidade permanecia constante, enquanto a velocidade global dos ônibus aumentou aproximadamente 10%, de 15 km/h em 2012 para 17 km/h em 2015 na hora de pico da noite.
As críticas sobre as ciclovias se baseavam principalmente na retirada de vagas de estacionamento e a falta de planejamento das ciclovias em algumas regiões. De fato, em alguns casos crê-se que que nenhum estudo de traçado, de demanda ou de viabilidade foi realizado. Fala-se ainda que alguns trechos de ciclovia foram criados apenas para atingir o objetivo estabelecido pela prefeitura.
A ciclovia da Av. Paulista foi também centro de discussões quando da sua inauguração, já que ela está localizada numa via emblemática da cidade. Alguns grupos mais “conservadores” não queriam que sua “identidade fosse modificada”, além do fato de as obras terem causado transtornos no trânsito numa das vias mais movimentadas da São Paulo.
Outras iniciativas, de caráter recreativo, existem. O Programa Ruas Abertas estabelece 29 ruas e avenidas na cidade de São Paulo que têm o trânsito de carros bloqueados aos domingos e feriados, criando, assim, espaços de lazer.
Além disso, também aos domingos e feriados as pistas centrais de algumas outras avenidas da cidade ficam reservadas para bicicletas, tornando-se “ciclo faixas”.
A gestão atual de João Doria (2017-2020) aponta três objetivos referentes à mobilidade urbana:
- Objetivo 21: Reduzir o índice de mortes no trânsito para valor igual ou inferior a 6 a cada 100 mil habitantes/ano (valor base 7,48 / 100 mil habitantes entre outubro de 2015 e setembro de 2016);
- Objetivo 22: Aumentar em 10% a participação da mobilidade ativa em São Paulo;
- Objetivo 23: Aumentar em 7% o uso do transporte público em São Paulo.
De acordo com o GESP, no primeiro semestre de 2017, foram registradas 482 mortes no trânsito na cidade de São Paulo. O índice de mortes no trânsito na primeira metade do ano foi de 4,12 mortes/100 000 habitantes, ou seja, mais que a metade da meta de 6 mortes/100 000 habitantes por ano.
Ainda sobre a mobilidade urbana, a gestão Haddad enfrentou críticas em relação à redução, em junho de 2015, da velocidade nas Marginais Pinheiros e Tietê.
Os motoristas reclamavam do aumento do tempo do trajeto e do número de multas. No entanto, o número de acidentes mortais diminuiu aproximadamente 50% nos 15 meses seguintes à redução da velocidade, em relação aos 15 meses anteriores da redução. Um dos compromissos de João Doria na sua campanha para as eleições municipais foi o aumento das velocidades nas marginais, voltando aos valores da metade de 2015. Com sua eleição, ele manteve a promessa e, em janeiro de 2017, as velocidades aumentaram, exceto para as vias locais.
Poluição local e emissões GEE
A Prefeitura de São Paulo aprovou, em 2009, a Lei de Mudanças Climáticas, estabelecendo diretrizes gerais para a redução das emissões na cidade de São Paulo. Uma das metas era de reduzir de 30% as emissões totais, e não somente no setor de transportes, de GEE até 2012 em referência aos níveis de emissão de 2005. Contrariamente à meta, as emissões neste período aumentaram de 4%.[7]
Pela mesma lei, as operadoras de ônibus municipal teriam até 2018 para substituir todos os ônibus movidos a combustíveis fósseis por ônibus de energias renováveis (elétricos, a etanol e trólebus, por exemplo). Atualmente, menos de 2% da frota é não-poluente. Para os operadores, esta política teria sido pensada somente pelas questões ambientais, ignorando os aspectos econômicos e financeiros dos operadores[8].
O “Inventário de Emissões Atmosféricas do Transporte Rodoviário de Passageiros no Município de São Paulo”, publicado em junho de 2017 pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), mostra que os automóveis são responsáveis por 72% das emissões de GEE e por 88% dos quilômetros percorridos (VKM) na cidade de São Paulo.
Ademais, em termos de emissões por passageiro-quilômetro produzido, os automóveis são os mais poluentes, seguidos pelas motocicletas e os ônibus municipais, como se nota na tabela ao lado.
Os automóveis também lideram as emissões de poluentes locais, tendo melhor resultado apenas para os óxidos de nitrogênio.
Em São Paulo, muito se fala sobre a poluição dos ônibus e que uma frota de ônibus mais limpos melhoria a poluição paulistana. Sem dúvida, ônibus movidos a combustíveis renováveis contribuiriam para a redução da poluição, mas este estudo do IEMA deixa claro que os ônibus não são o maior problema da poluição da metrópole.
Neste sentido, há que se adotar políticas que incentivem a substituição dos automóveis particulares por modos alternativos de transporte. Além, é claro, investir em transporte público de média e alta capacidade, como os corredores de ônibus e os modos ferroviários urbanos, é necessário olhar para os transportes ativos, melhorando a infraestrutura cicloviária e as calçadas, já que mais de 30% das viagens diárias são realizadas a pé.
[7] https://www.nossasaopaulo.org.br/noticias/principais-metas-da-lei-de-mudanca-do-clima-de-sao-paulo-nao-estao-sendo-cumpridas
[8] https://www.ghgprotocolbrasil.com.br/uma-nova-lei-do-clima-para-os-onibus-de-sao-paulo?locale=pt-br
Informação sobre a monografia
Acrônimos
- BOM Bilhete Ônibus Metropolitano
- BU Bilhete Único
- CBTU Companhia Brasileira de Trens Urbanos
- CDHU Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo
- CDRMSP Comitê de Desenvolvimento da RMSP
- CET Companhia de Engenharia de Tráfego
- CMT Consórcio Metropolitano de Transportes
- CPTM Companhia Paulista dos Trens Metropolitanos
- EFCJ Estrada de Ferro Campos do Jordão
- EMPLASA Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A.
- EMTU Empresa Metropolitana dos Transportes Urbanos
- FEPASA Ferrovia Paulista S/A
- GEE Gases do efeito estufa
- GESP Governo do Estado de São Paulo
- IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
- IEMA Instituto de Energia e Meio Ambiente
- METRÔ Companhia do Metropolitano de São Paulo
- PDUI Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado
- PEC Proposta de Emenda à Constituição
- PITU Plano Integrado de Transportes Urbanos
- PMU Plano de Mobilidade Urbana
- PPA Plano Plurianual
- RMBS Região Metropolitana da Baixada Santista
- RMSP Região Metropolitana de São Paulo
- SLT Secretaria de Logística e Transportes
- SMDU Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano
- SPTRANS São Paulo Transportes
- STM Secretaria dos Transportes Metropolitanos
Leituras interessantes
Documento-base Contribuição Nacionalmente Determinada, fevereiro de 2017
Plano Diretor Estratégico – Texto da Lei Ilustrado, julho de 2014
Plano Plurianual, dezembro de 2015
Referências
- ANP https://www.anp.gov.br/preco/prc/Resumo_Semanal_Posto.asp
- CET https://www.cetsp.com.br/media/562061/relatorioanualacidentestransito-2016.pdf
- DENATRAN https://www.denatran.gov.br/estatistica/237-frota-veiculos
- EMPLASA https://www.emplasa.sp.gov.br/RMSP
- Governo do Estado de São Paulo https://www.infosiga.sp.gov.br/
- Governo Federal https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12587.htm https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13089.htm
- IBGE https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pof/tabelas https://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=355030
- IEMA https://emissoes.energiaeambiente.org.br/
- METRÔ https://www.metro.sp.gov.br/
- PMSP https://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/index.php?cat=12&titulo=Transportes https://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/tema/17 https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/meio_ambiente/comite_do_clima/legislacao/leis/index.php?p=15115
- Senado Federal https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/115729
- SPG https://www.ppa.sp.gov.br/o_que_e
- SPTrans https://www.sptrans.com.br/indicadores
- STM https://www.stm.sp.gov.br/transparencia/informações